top of page

Azulada

Azulada é a paisagem a certa distância e é nessa distância que se inscrevem os trabalhos de Lygia Eluf apresentados na presente exposição. A paisagem sempre foi a matéria bruta com a qual a artista cria. Em seus quadros e gravuras mais conhecidos, formas geométricas se arranjam na superfície da obra, buscando traduzir a paisagem em arte. As cores, que introduzem um elemento imponderável à rigorosa estrutura ortogonal desses trabalhos, dançando ritmicamente entre as formas, é o testemunho vivo da presença da natureza na obra. A tradução da paisagem em arte é um exercício de disciplina e rigor que cria uma distância entre a imersão da artista no mundo e a construção de seu discurso visual. O resultado desse processo é sempre uma abstração.

Para os que acompanham a obra da artista e conhecem o rigor com que ela opera sua arte, a presente exposição deverá surpreender. Nos quadros apresentados, um elemento subversivo infiltra-se entre suas linhas rigorosas e a presença palpitante do mundo insinua-se em seus horizontes. Aquilo que nos cai sob os olhos ao percorrermos as salas da galeria é fruto de um encontro improvável entre a artista, tradutora de paisagens, com Velazquez, Goya e com a Espanha. Lygia Eluf acaba de retornar de Madrid, onde passou vários meses realizando pesquisas no contexto de um intercâmbio acadêmico com a Universidade de Madrid, e essa passagem pelo outro, pela paisagem cultural e natural daquele país, tornou-se, para ela, matéria de reflexão.

Cláudia Valladão de Mattos

As horas consumidas no Prado a observar Velazquez, esse artista que fez dos labirintos da representação o tema de sua obra, e Goya, que pôs sua arte a serviço da representação da vida, deslocou o interesse da artista em direção aos processos de tradução da matéria viva das coisas em pensamento plástico. Se os trabalhos de Lygia Eluf nos ofereciam o mundo já traduzido em linguagem de formas e cores, agora temos diante dos olhos o embate entre experiência e razão do qual resultam suas obras. Especialmente na série de desenhos em pastel que abre a exposição, podemos acompanhar os movimentos desse processo de transformação da experiência em arte, do qual ela extrai uma nova poesia. O rigoroso respeito à superfície plana do papel, ou da tela, que garantia a plena autônoma de sua arte em relação ao mundo, que fazia dessa arte um mundo paralelo ao da experiência do corpo real da artista na paisagem, agora se rompe aqui e ali, revelando as distâncias e o esforço do olho atento que se debruça sobre o mundo para tocá-lo. Nesses belos quadros temos encenado o próprio drama da representação. Nós espectadores, somos lançados nesse labirinto que é o caldeirão da atividade criativa e nos comovemos com a honestidade e a coragem da artista que, após ter criado com tanto rigor e trabalho seus próprios mundos, abandona-os para mergulhar novamente no espaço incerto onde eternamente se elaboram as infinitas escrituras sobre a realidade.

Galeria

bottom of page